O Sucesso do programa de A.A.
deve-se ao fato de que quem não está bebendo tem uma excepcional facilidade de
ajudar um bebedor problema.
Esta é a simplicidade do Programa
de A.A. , quando um alcoólico recuperado pelos passos, relata seus problemas
com a bebida, descreve como está sua sobriedade e o que encontraram em A.A. e
abordam um provável ingressante a experimentar essa possibilidade.
O centro desse programa sugerido
é baseado em doze passos que estão descritos a seguir:
1. Admitimos que éramos
impotentes perante o álcool - que tínhamos perdido o domínio sobre nossas
vidas.
Quem se dispõe a admitir a
derrota completa? Quase ninguém, é claro.
Todos os instintos naturais
gritam contra a idéia da impotência pessoal. É verdadeiramente terrível admitir
que, com o copo na mão, temos convertido nossas mentes numa tal obsessão pelo
beber destrutivo, que somente um ato da Providência pode removê-la.
Nenhuma outra forma de falência é
igual a esta. O álcool, transformado em voraz credor, nos esvazia de toda
auto-suficiência e toda vontade de resistir às suas exigências. Uma vez que
aceitamos este fato, nu e cru, nossa falência como seres humanos está completa.
Porém, ao ingressar em A.A., logo
encaramos essa humilhação absoluta de uma maneira bem diferente. Percebemos que
somente através da derrota total é que somos capazes de dar os primeiros passos
em direção à libertação e ao poder. Nossa admissão de impotência pessoal acaba
por tornar-se o leito de rocha firme sobre o qual poderão ser construídas vidas
felizes e significativas.
Sabemos que pouca coisa de bom
advirá a qualquer alcoólico que se torne membro de A.A. sem aceitar sua
devastadora debilidade e todas as suas conseqüências. Até que se humilhe desta
forma, sua sobriedade - se a tiver - será precária.
Da felicidade verdadeira, nada
conhecerá. Comprovado sem sombra de dúvida por uma longa experiência, este é um
dos fatos de vida de A.A. O princípio de que não encontraremos qualquer força
duradoura sem que antes admitamos a derrota completa, é a raiz principal da
qual germinou e floresceu nossa Irmandade toda.
2. Viemos a acreditar que um
Poder Superior a nós mesmos poderia devolver-nos à sanidade.
A partir
do momento em que lê o Segundo Passo, a maioria dos novos em A.A. enfrenta um
dilema, às vezes bastante sério.
Quantas vezes os temos ouvido
reclamar: "olhem o que vocês fizeram conosco. Convenceram-nos de que somos
alcoólicos e que nossas vidas são ingovernáveis. Havendo nos reduzido a um
estado de desespero absoluto, agora nos informam que somente um Poder Superior
poderá resolver nossa obsessão. Alguns de nós se recusam a acreditar em Deus,
outros não conseguem acreditar e ainda outros acreditam na existência de Deus,
mas de forma alguma confiam que Ele levará a cabo este milagre. Pois é, nos
meteram num buraco sem saída, tudo bem, mas e agora, para onde vamos?"
3. Decidimos entregar nossa
vontade e nossa vida aos cuidados de Deus, na forma em que O concebíamos.
A prática do Terceiro Passo é
como abrir uma porta que até então parecia estar fechada à chave. Tudo o que
precisamos é a chave e a decisão de abrir a porta. Existe apenas uma só chave,
e se chama boa
vontade. Uma vez usada a chave da boa vontade, a porta se abre quase que
sozinha. Olhando-se através dela, ver-se-á um caminho ao lado do qual há uma
inscrição que diz: "Eis o caminho em direção àquela fé que realmente
funciona."
Nos primeiros dois passos
estivemos refletindo. Vimos que éramos impotentes perante o álcool, mas também
percebemos que alguma espécie de fé, mesmo que fosse somente em A.A., estava ao
alcance de qualquer um.
Essas conclusões não requereram
ação; requereram apenas aceitação.
Como todos os outros, o Terceiro
Passo pede uma ação positiva, pois é somente através de ação que conseguimos
interromper a vontade própria que sempre impediu a entrada de Deus - ou, se
preferir, de um Poder Superior - em nossas vidas. A fé é necessária certamente,
porém a fé isolada pode resultar em nada. Podemos ter fé, mas manter Deus fora
de nossas vidas.
Portanto, o nosso problema agora
é descobrir como e por que meios específicos, poderemos deixá-lo entrar. O Terceiro
Passo representa nossa primeira tentativa de alcançar isso. Aliás, a eficácia
de todo programa de A.A. dependerá de quão bem e sinceramente tenhamos tentado
chegar à decisão de "entregar nossa vontade e nossa vida aos cuidados de
Deus, na forma em que O concebíamos" .
4. Fizemos minucioso e
destemido inventário moral de nós mesmos.
A Criação nos deu os instintos
por alguma razão. Sem eles não seríamos seres humanos completos. Se os homens
as mulheres não se esforçassem a fim de se sentir seguros, a fim de conseguir
alimento ou construir abrigo, não sobreviveriam; se não se
reproduzissem, a Terra não seria povoada; se não existisse o instinto social,
se os homens não se interessassem pelo convívio com seus semelhantes, não
haveria sociedade. Portanto, estes desejos - pela relação sexual, pela
segurança material e emocional, e pelo companheirismo - são perfeitamente
necessários e naturais, e certamente dados a nós por Deus.
Contudo, estes instintos, tão
necessários para nossa existência, frequentemente excedem bastante suas funções
específicas. Fortemente, cegamente e muitas vezes simultaneamente, eles nos
impulsionam, dominam e insistem em dirigir nossas vidas.
Nossos anseios pelo sexo, pela
segurança material e emocional, e por posição importante na sociedade, nos
tiranizam com freqüência.
Quase deturpados desta forma, os
desejos naturais do homem causam-lhe grandes problemas, aliás quase todos o
problemas que existem. Nenhum ser humano, por melhor que seja, fica livre
destas dificuldades. Quase todo problema emocional grave pode ser considerado
como um caso de instintos deturpados. Quando isso acontece, nossas grandes
qualidades naturais, os instintos, tornam-se empecilhos físicos e mentais.
O Quarto Passo representa nosso
esforço enérgico e meticuloso para descobrir quais foram, e são, esses
obstáculos em cada um de nós. Queremos descobrir exatamente como, quando e onde
nossos desejos naturais nos deformaram. Queremos olhar de frente a infelicidade
que isto causou aos outros e a nós mesmos.
Descobrindo quais são nossas
deformidades emocionais, podemos nos encaminhar em direção à correção delas.
Sem um esforço voluntário e
persistente para lograr isso, haverá pouca sobriedade e felicidade para nós.
Sem um minucioso e destemido inventário moral, a maioria de nós verificou que a
fé que realmente funciona na vida diária permanece fora de alcance.
5. Admitimos perante Deus,
perante nós mesmos e perante outro ser humano, a natureza exata de nossas
falhas.
Todos os Doze Passos de A.A. nos
pedem para atuar em sentido contrário aos nossos desejos naturais, todos
desinflam nosso ego. Quando se trata de desinflar o ego, poucos passos são mais
duros de aceitar que o Quinto.
Mas, dificilmente, algum deles é
mais necessário à obtenção da sobriedade prolongada e à paz de espírito do que
este.
A experiência de A.A. nos indicou
que não podemos viver sozinhos com insistentes problemas e os defeitos de
caráter que os causam e agravam. Caso tenhamos passado o holofote do Quarto
Passo sobre nossas vidas, e se ele tiver realçado aquelas experiências que
preferimos não lembrar, se chegamos a aprender como os pensamentos e as ações
erradas feriram a nós e a outrem, então se toma mais imperativo do que nunca
desistir de viver sozinhos com esses fantasmas torturantes de ontem. É preciso
falar com alguém a esse respeito. Tão intensos, porém, são nosso medo e a
relutância de fazê-lo que, ao início, muitos AAs tentam contornar o Quinto
Passo. Procuramos uma maneira mais fácil que geralmente consiste na admissão
ampla e quase indolorosa de que, quando bebíamos, éramos, às vezes, maus
elementos. Então, para completar, acrescentamos descrições dramáticas desse lado
de nosso comportamento quando bêbados que, em todo caso, nossos amigos
provavelmente já conhecem.
Mas, das coisas que realmente nos
aborrecem e marcam, nada dizemos. Certas lembranças penosas e aflitivas,
dizemos para nós mesmos, não devem ser compartilhadas com ninguém. Essas serão
nosso segredo. Ninguém deve saber. Esperamos levá-las conosco para a sepultura.
Contudo, se a experiência de A.A.
serve para algo, ela nos diz que a esse procedimento, não só falta critério,
como também, é uma resolução perigosa. Poucas atitudes atrapalhadas causaram
mais problemas do que recusar-se à pratica do Quinto Passo. Algumas pessoas são
incapazes de permanecer sóbrias, outras recairão periodicamente enquanto não
fizerem uma verdadeira "limpeza de casa".
6. Prontificamo-nos
inteiramente a deixar que Deus removesse todos esses defeitos de caráter.
"Este é o passo que separa
os adultos dos adolescentes ..."
Eis o que declara um clérigo
muito querido que, por sinal, é um dos melhores amigos de A.A. Ele prossegue
para explicar que qualquer pessoa cheia de disposição e honestidade suficientes
para, repetidamente, experimentar o Sexto Passo com respeito a todos seus
defeitos - em absoluto sem qualquer reserva - tem realmente andado um bom
pedaço no campo espiritual e, portanto, merece ser chamado de um homem que está
sinceramente empenhado em crescer à imagem e semelhança do Criador.
Evidentemente, a tão discutida
pergunta sobre se Deus pode - e quer, sob certas condições - remover os
defeitos de caráter, será respondida afirmativamente pela quase totalidade dos
membros de A.A. Para eles, esta proposição não será apenas teoria; será
simplesmente uma das maiores realidades de suas vidas. Geralmente oferecerão
suas provas em exposição semelhante a esta: "É claro, estava vencido,
completamente derrotado. Minha própria força de vontade simplesmente não
funcionava no caso do álcool. Mudanças de ambiente, os melhores esforços de
parentes, amigos, médicos e clérigos nada adiantaram no caso do meu alcoolismo.
Simplesmente não conseguia parar de beber, e nenhum ser humano parecia ter a
capacidade de me ajudar. Porém, quando me dispus a "limpar a casa" e,
roguei a um Poder Superior, Deus, como eu o compreendia, que me
7. Humildemente rogamos a Ele
que nos livrasse de nossas imperfeições.
Já que este passo trata tão
especificamente da humildade, deveríamos fazer uma pausa aqui para pensar sobre
o que é a humildade e o que a sua prática poderá significar para nós.
Realmente,
conseguir maior humildade é o princípio fundamental de cada um dos Doze Passos
de A.A., pois sem um certo grau de humildade, nenhum alcoólico poderá
permanecer sóbrio.
Além disso, quase todos os AAs
descobriram que sem desenvolver esta preciosa virtude além do estritamente
necessário à sobriedade, não terão muita probabilidade de serem felizes.
Sem ela, não podem viver uma vida
de muita utilidade ou, com os contratempos, convocar a fé que enfrenta qualquer
emergência.
A humildade, como palavra e
ideal, tem passado bem mal em nosso mundo, não somente é mal entendida a idéia,
mas, frequentemente a palavra em si desagrada profundamente. Muitas pessoas não
praticam, mesmo ligeiramente, a humildade como um modo de vida. Uma boa parte
da conversa cotidiana que ouvimos, e muito do que lemos, salienta o orgulho que
o homem tem de suas próprias realizações.
Com grande inteligência, os
homens de ciência vêm forçando a natureza a revelar seus segredos. Os imensos
recursos que atualmente podem ser utilizados, prometem tamanha quantidade de
bens e confortos materiais que muitos chegaram a acreditar que como obra do
homem em breve chegaremos a desfrutar o milênio.
A pobreza desaparecerá, e haverá
tanta abundância que todos, amplamente garantidos, terão realizados todos os
seus desejos.
Em teoria parece ser assim: uma
vez satisfeitos os instintos primários de todos, pouca coisa restará que possa
levá-los à discórdia. Então, o mundo se tornará feliz e livre para
concentrar-se no desenvolvimento da cultura e do caráter. Apenas com sua
própria inteligência e esforço, os homens terão construído seu próprio destino.
Certamente nenhum alcoólico e,
sem dúvida, nenhum membro de A.A. quer condenar os avanços materiais. Nem
entramos em debate com muita gente que ainda se agarra com tanta paixão à
crença de que satisfazer os nossos desejos básicos é o objetivo principal da
vida. Porém, estamos convencidos de que nenhuma classe de pessoas no mundo
jamais se atrapalhou tanto tentando viver segundo tal pensamento, como os
alcoólicos.
Há milhares de anos vimos
querendo mais do que a nossa parcela de segurança, prestígio e romance. Quando
parecíamos estar obtendo êxito, bebíamos para viver sonhos ainda maiores e
quando estávamos frustrados, mesmo um pouco, bebíamos até o esquecimento.
Nunca havia o suficiente daquilo
que julgávamos querer. Em todos esses empenhos, muitos dos quais bem
intencionados, ficamos paralisados pela nossa falta de humildade. Havia nos
faltado a perspectiva para enxergar que o aperfeiçoamento do caráter e os
valores espirituais deveriam vir primeiro e que as satisfações materiais não
constituíam o propósito da vida. De forma bem caracterizada, havíamos
confundido os fins com os meios. Ao invés de considerar a satisfação de nossos
desejos materiais como meios pelos quais podíamos viver e funcionar como
humanos, entendemos que estas satisfações constituíam a única finalidade e
objetivo da vida.
É verdade que a maioria de nós
considerava desejável um bom caráter, porém mais como algo de que se iria
necessitar para estar satisfeito consigo mesmo.
8. Fizemos uma relação de
todas as pessoas a quem tínhamos prejudicado e nos dispusemos a reparar os
danos a elas causados.
Os Oitavo e Nono Passos se
preocupam com as relações pessoais.
Primeiro, olhamos para o passado
e tentamos descobrir onde erramos; então, fazemos uma enérgica tentativa de
reparar os danos que tenhamos causado; e, em terceiro lugar, havendo desta
forma limpado o entulho do passado, consideramos de que modo, com o novo
conhecimento de nós mesmos, poderemos desenvolver as melhores relações possíveis
com todas as pessoas que conhecemos.
Eis uma incumbência difícil. É
uma tarefa que poderemos realizar com crescente habilidade, sem contudo jamais
concluí-la. Aprender a viver em paz, companheirismo e fraternidade com qualquer
homem e mulher, é uma aventura comovente e fascinante. Todo AA acabou
descobrindo que pouco pode progredir nesta nova aventura de viver sem antes
voltar atrás e fazer, realmente, um exame acurado e impiedoso dos destroços
humanos que porventura tenha deixado em seu passado. Até certo ponto, tal exame
já foi feito quando fez o inventário moral, mas agora chegou a hora em que
deveria redobrar seus esforços para ver quantas pessoas feriu e de que forma.
Esta reabertura das feridas emocionais, algumas velhas, outras talvez
esquecidas e ainda outras, sangrentas e dolorosas, dará a impressão, à primeira
vista, de ser uma operação desnecessária e sem propósito. Mas se for reiniciada
com boa vontade, então as grandes vantagens de assim proceder vão se revelando
tão rapidamente que a dor irá diminuindo à medida que os obstáculos, um a um,
forem desaparecendo.
Tais obstáculos, contudo, são
muito reais. O primeiro e um dos mais difíceis, diz respeito ao perdão.
Desde o momento em que examinamos
um desentendimento com outra pessoa, nossas emoções se colocam na defensiva.
Evitando encarar as ofensas que temos dirigido a outro, costumamos salientar,
com ressentimento, as afrontas que ele nos tem feito. Isto acontece
especialmente quando ele, de fato, tenha se comportado mal.
Triunfalmente nos agarramos à sua
má conduta como a desculpa perfeita para minimizar ou esquecer a nossa.
Devemos, a essa altura, nos deter
imediatamente. Não faz sentido um autêntico beberrão roto, rir-se do
esfarrapado.
Lembremo-nos de que os alcoólicos
não são os únicos afligidos por emoções doentias. Além do mais, geralmente é um
fato que, quando bebíamos, nosso comportamento agravava os defeitos dos outros.
Repetidamente abusamos da paciência de nossos melhores amigos a ponto de
esgotá-los, e despertamos as piores reações naqueles que, desde o início, não
gostaram de nós. Em muitos casos estamos, na realidade, em frente a
co-sofredores, pessoas que tiveram suas desditas aumentadas pela nossa
contribuição.
Se estamos a ponto de pedir
perdão para nós mesmos, por que não começar por perdoar a todos eles?
Ao fazer a relação das pessoas às
quais prejudicamos, a maioria de nós depara com outro resistente obstáculo.
Sofremos um choque bastante grave quando nos damos conta que estávamos
preparando a admissão de nossa conduta desastrosa cara a cara perante aqueles
que havíamos tratado mal. Já foi bastante embaraçoso, quando em confiança,
havíamos admitido estas coisas perante Deus, nós mesmos e outro ser humano. Mas
a perspectiva de chegar a visitar ou mesmo escrever às pessoas envolvidas,
agora nos parecia difícil, sobretudo quando lembrávamos a desaprovação com que
a maioria delas nos encarava. Também havia casos em que havíamos prejudicado
certas pessoas que, felizmente, ainda desconheciam que haviam sido
prejudicadas.
Por que, lamentávamos, não
esquecer o que se passou? Por que devemos considerar até essas pessoas? Estas
eram algumas das maneiras em que o medo conspirava com o orgulho para impedir
que fizéssemos uma relação de todas as pessoas às quais tínhamos prejudicado.
Alguns de nós, contudo, tropeçaram em um obstáculo bem diferente. Apegamo-nos à
tese de que, quando bebíamos, nunca ferimos alguém, exceto nós mesmos. Nossas
famílias não sofreram porque sempre pagamos as contas e raramente bebemos em
casa. Nossos colegas de trabalho não foram prejudicados, porque geralmente
comparecíamos ao trabalho.
Nossa reputação não havia
sofrido, porque estávamos certos de que poucos sabiam de nossas bebedeiras e
aqueles que sabiam nos asseguravam, às vezes, que uma boa farra, afinal de
contas, não passava de uma falha de um bom sujeito. Que mal, portanto, havíamos
cometido realmente. Certamente nada que não pudéssemos consertar com algumas
desculpas banais.
É claro que esta atitude é o resultado
final do esquecimento forçado. É uma atitude que só pode ser mudada por uma
busca profunda e honesta de nossas motivações e ações.
Embora em alguns casos não
possamos fazer reparação alguma, e em outros o adiamento da ação seja
preferível, deveríamos, contudo, fazer um exame acurado, real e exaustivo da
maneira pela qual nossa vida passada afetou as outras pessoas. Em muitas
instâncias descobriremos que, mesmo que o dano causado aos outros não tenha
sido grande, o dano emocional que causamos a nós mesmos foi enorme. Embora, às
vezes, totalmente esquecidos, os conflitos emocionais que nos prejudicaram se
ocultam e permanecem, em lugar profundo, abaixo do nível da consciência.
9. Fizemos reparações diretas
dos danos causados a tais pessoas, sempre que possível, salvo quando fazê-las
significasse prejudicá-las ou a outrem.
Bom-senso, um cuidadoso sentido
de escolha do momento, coragem e prudência - eis as qualidades que precisamos
ter quando damos o Nono Passo.
Após haver
elaborado a relação das pessoas as quais prejudicamos, refletido bem sobre cada
caso específico e procurado nos imbuir do propósito correto para agir, veremos
que o reparo dos danos causados divide em várias classes aqueles aos quais nos
devemos dirigir. Haverá os que deverão ter preferências, tão logo estejamos
razoavelmente confiantes em poder manter nossa sobriedade. Haverá aqueles aos
quais poderemos fazer uma reparação apenas parcial, para que revelações completas
não façam a eles e a outros mais danos do que reparos. Haverá outros casos em
que a ação deverá ser adiada, e ainda outros em que, pela própria natureza da
situação, jamais poderemos fazer um contato pessoal direto.
A maioria de nós começa a fazer certos
tipos de reparos a partir do dia em que nos tornamos membros de Alcoólico
Anônimos.
Desde o momento em que dizemos às
nossas famílias que verdadeiramente pretendemos tentar adotar o programa, o
processo se inicia. Nesta área, raramente existirá o problema de escolher o
momento ou ter cautela. Queremos entrar pela porta gritando as boas novas. Após
voltar de nossa primeira reunião ou, talvez, após haver terminado de ler o
livro Alcoólicos Anônimos, geralmente queremos nos sentar com algum membro da família
e admitir, de uma vez, os prejuízos que temos causado com nosso beber. Quase
sempre queremos ir mais longe e admitir outros defeitos que fizeram com que
fosse difícil viver conosco. Esse será um momento bem diferente e em grande
contraste com aquelas manhãs de ressaca em que oscilamos entre insultar a nós
mesmos e culpar a família (e todos os outros) pelos nossos infortúnios. Nesta
primeira sessão, basta fazer uma admissão geral de nossos defeitos. Poderá ser
pouco prudente, a esta altura, reviver episódios angustiantes. O bom-senso
sugerirá que devemos ir com calma.
Embora possamos estar
inteiramente dispostos a revelar o pior, precisamos nos lembrar que não podemos
comprar nossa paz de espírito à custa dos outros. O mesmo procedimento se
aplicará no escritório ou na fábrica.
Logo pensaremos em algumas
pessoas que conhecem bem nossa maneira de beber e que foram as mais afetadas
pela mesma.
Porém, mesmo nestes casos,
precisaremos usar de um pouco mais de discrição do que com nossa família.
Talvez nada queiramos dizer por algumas semanas ou até mais. Primeiro,
desejaremos estar razoavelmente seguros de que estamos firmes no programa de
A.A. Então, estaremos prontos para procurar estas pessoas, dizer-lhes o que é
A.A. e o que estamos tentando fazer. Isso explicado, podemos admitir livremente
os danos que causamos e pedir desculpas. Podemos pagar ou prometer pagar, as
obrigações financeiras ou outras, que tivermos. A recepção generosa da maioria
das pessoas perante tal sinceridade frequentemente nos assombrará. Até nossos
mais severos e justificados críticos, com freqüência nos acolherão bem na
primeira tentativa.
10. Continuamos fazendo o
inventário pessoal e quando estávamos errados, nós o admitíamos prontamente.
Quando vamos praticando os nove
primeiros passos, estamos nos preparando para a aventura de uma nova vida.
Mas, ao nos aproximarmos do
Décimo Passo, começamos a nos submeter à maneira de viver de A.A., dia após
dia, em tempo bom ou mau.
Então, vem a prova decisiva:
podemos permanecer sóbrios, manter nosso equilíbrio emocional e viver utilmente
sob quaisquer condições?
Uma olhada contínua sobre nossas
qualidades e defeitos e o firme propósito de aprender e crescer por esta forma,
são necessidades para nós. Nós alcoólicos aprendemos isso de maneira difícil.
Em todos os tempos e lugares, é claro, pessoas mais experientes adotaram a
prática do auto-exame e da crítica impiedosa. Os sábios sempre souberam que
alguém só consegue fazer alguma coisa de sua vida depois que o exame de si mesmo
venha a se tornar um hábito regular, admita e aceite o que encontre e, então,
tente corrigir o que lhe pareça errado, com paciência e perseverança.
Um ébrio não pode viver bem hoje
se está com uma terrível ressaca, resultante do excesso de bebidas ontem
ingerido. Porém, existe outro tipo de ressaca que todos experimentamos, bebendo
ou não. É a ressaca emocional, fruto direto do acúmulo de emoções negativas
sofridas ontem e, às vezes, hoje - o rancor, o medo, o ciúme e outras
semelhantes. Se queremos viver serenamente hoje e amanhã, sem dúvida temos que
eliminar estas ressacas. Isto não quer dizer que devamos perambular
morbidamente pelo passado. Requer, isto sim, a admissão e correção dos erros
agora. No inventário podemos pôr em ordem o nosso passado. Feito isso, nos
tornamos de fato capazes de deixá-lo para trás. Se nosso balanço é feito com
cuidado e se tivermos obtido paz conosco mesmo, segue-se a convicção de que os
desafios do amanhã poderão ser encarados à medida em que se apresentem.
Embora todos os inventários, em
princípio, sejam iguais, a ocasião os faz diferentes. Há o
"relâmpago", feito a qualquer hora, toda vez em que nos encontremos
enredados. Existe o do fim de cada jornada, quando revisamos os acontecimentos
das últimas vinte e quatro horas. É neste verdadeiro balancete diário que
creditamos a nosso favor ou debitamos contra nós as coisas que julgamos bem ou
mal feitas. De tempo em tempo, surgem as ocasiões em que, sozinhos ou
assessorados pelos nossos padrinhos ou conselheiros espirituais, fazemos a
revisão atenta de nosso progresso durante a última etapa. Muitos AAs costumam
fazer uma "limpeza geral" em cada ano ou período de seis meses.
Outros de nós também preferem a experiência de um retiro, onde isolados do
mundo exterior, calma e tranquilamente, podem proceder à auto-revisão e à
meditação sobre os resultados.
11. Procuramos, através da
prece e da meditação, melhorar nosso contato consciente com Deus, na forma em
que O concebíamos, rogando apenas o conhecimento de Sua vontade em relação a
nós, e forças para realizar essa vontade.
A oração e a meditação são nossos
meios principais de contato consciente com Deus.
Nós AAs somos pessoas ativas,
desfrutando a satisfação de lidar com as realidades da vida, geralmente pela
primeira vez em nossas vidas, tentando denodadamente ajudar o primeiro
alcoólico que aparecer. Portanto, não é de se estranhar que, com freqüência,
façamos pouco caso da meditação e da oração séria como não sendo coisas de real
necessidade. Sem dúvida, chegamos a considerá-las
como algo que possa nos ajudar a enfrentar uma emergência, mas, a princípio,
muitos dentre nós são capazes de entendê-las como expressão de um Dom
misterioso dos religiosos, do qual poderemos esperar qualquer benefício de
Segunda mão. É possível que não acreditemos em nada destas coisas.
Para certos ingressantes e para
aqueles antigos agnósticos que ainda se apegam ao grupo de A.A. como sua “força
superior”, as afirmações sobre o poder da oração, apesar de toda a lógica e a
experiência que a comprovam, podem não convencer e até desagradar bastante.
Aqueles entre nós que uma vez já se sentiram assim, certamente podem Ter por
eles simpatia e compreensão. Recordamo-nos muito bem da revolta que se
levantava em nosso íntimo contra a idéia de genuflexão perante qualquer Deus.
Outros, usando lógica convincente, “provavam” a não existência de Deus. E os
acidentes, a doença, a crueldade e a injustiça do mundo? E todas essas
criaturas infelizes, resultados diretos da pobreza e de um conjunto de
circunstâncias incontroláveis? À vista desses fatos, não poderia haver justiça
e, consequentemente, qualquer Deus.
Às vezes, argumentávamos de outra
maneira. Está certo, nos dizíamos, a galinha provavelmente veio antes do ovo.
Sem dúvida o universo teve algum tipo de “origem primeira”; o Deus do átomo,
quem sabe, se transformando sucessivamente em frio e calor. Mas certamente não
havia indicação alguma da existência de um Deus que conhecia e se interessava
pelos homens. Gostávamos de A.A. e não hesitávamos em dizer que operava
milagres. Todavia, ante a meditação e a oração, sentíamos o mesmo retraimento
do cientista que se recusava a realizar certa experiência por temor de Ter que
derrubar sua teoria predileta. É claro que no fim resolvemos experimentar e,
quando surgiram resultados inesperados, nós vimos as coisas diferentes; de
fato, sentimos de forma diferente e acabamos capitulando totalmente diante da
meditação e da oração. E isso, descobrimos, pode acontecer com qualquer pessoa
que experimente. Acertou quem disse que “os chacoteadores da oração são, quase
sempre, aqueles que não a experimentaram devidamente.”
12. Tendo experimentado um
despertar espiritual, graças a estes Passos, procuramos transmitir esta
mensagem aos alcoólicos e praticar estes princípios em todas as nossas
atividades.
No Décimo Segundo Passo de A.A.,
o prazer de viver é o tema e a ação sua palavra chave. Chegou a oportunidade de
nos voltarmos para fora em direção de nossos companheiros alcoólicos ainda
aflitos. Nessa altura, estamos experimentando o dar pelo dar, isto é, nada pedindo
em troca. Agora começamos a praticar todos os Doze Passos em nossa vida diária
para que possamos todos, nós e as pessoas que nos cercam, encontrar a
sobriedade emocional. Quando conseguimos ver em que o Décimo Segundo Passo
implica, vemos que se trata do amor que não tem preço.
Este passo também nos diz que,
como resultado da prática de todos os passos, cada um de nós foi descobrindo
algo que se pode chamar de “despertar espiritual”. Para os AAs novos, este
estado de coisas pode parecer dúbio ou improvável. Eles perguntam: Que querem
dizer quando falam em “despertar espiritual”?
É possível que haja uma definição
de despertar espiritual para cada pessoa que o tenha experimentado. Contudo, os
casos autênticos, na verdade, têm algo comum entre si. Estas coisas comuns
entre eles são de fácil compreensão. Quando um homem ou uma mulher experimenta
um despertar espiritual, o significado mais importante disso é que se torna
capaz de fazer, sentir e acreditar em coisas como antes não podia, quando
dispunha apenas de seus próprios recursos desassistidos. A dádiva recebida
consiste em um novo estado de consciência e uma nova maneira de ser. Um novo
caminho lhe foi indicado, conduzindo-o a um lugar determinado, onde a vida não
é um beco sem saída, nem algo a ser suportado ou dominado. Foi transformado em
um sentido bem real, pois lançou mão de uma fonte de força que, de um modo ou
de outro, havia negado a si próprio até aqui. Encontrou-se possuindo um grau de
honestidade, tolerância, dedicação, paz de espírito e amor, dos quais se
supunha totalmente incapaz. O que recebeu foi um presente de graça, contudo,
geralmente, pelo menos em uma pequena medida, tornou-se pronto para recebê-lo