Do ponto de vista médico, o
alcoolismo , é uma doença crônica com aspectos comportamentais e
socioeconômicos, caracterizada pelo consumo compulsivo de álcool, na qual o
usuário se torna progressivamente tolerante à intoxicação produzida pela droga
e desenvolve sinais e sintomas de abstinência, quando a mesma é retirada.
Fatores genéticos
Sem desprezar a importância do
ambiente no alcoolismo, há evidências claras de que alguns fatores
genéticos aumentam o risco de contrair a doença.
O alcoolismo tende a ocorrer com
mais frequência em certas famílias, entre gêmeos idênticos (univitelinos), e
mesmo em filhos biológicos de pais alcoólicos adotados por famílias de pessoas
que não bebem.
Estudos mostram que adolescentes
abstêmios, filhos de pais alcoólicos, têm mais resistência aos efeitos do
álcool do que jovens da mesma idade, cujos pais não abusam da droga.
Muitos desses filhos de
alcoólicos se recusam a beber para não seguir o exemplo de casa. Quando
acompanhados por vários anos, porém, esses adolescentes apresentam maior
probabilidade de abandonar a abstinência e tornarem-se dependentes.
Filhos biológicos de pais
alcoólicos criados por famílias adotivas têm mais dificuldade de abandonar a
bebida do que alcoólicos que não têm história familiar de abuso da droga.
Intoxicação Aguda
O álcool cruza, com liberdade, a
barreira protetora que separa o sangue do tecido cerebral. Poucos minutos
depois de um drinque, sua concentração no cérebro já está praticamente igual à
da circulação.
Em pessoas que não costumam
beber, níveis sangüíneos de 50mg/dl a 150 mg/dl são suficientes para provocar
sintomas. Esses, por sua vez, dependem diretamente da velocidade com a qual a
droga é consumida, e são mais comuns quando a concentração de álcool está aumentando
no sangue do que quando está caindo.
Os sintomas da intoxicação aguda
são variados: euforia, perda das inibições sociais, comportamento expansivo
(muitas vezes inadequado ao ambiente) e emotividade exagerada. Há quem
desenvolva comportamento beligerante ou explosivamente agressivo.
Algumas pessoas não apresentam
euforia, ao contrário, tornam-se sonolentas e entorpecidas, mesmo que tenham
bebido moderadamente. Segundo as estatísticas, essas quase nunca
desenvolvem alcoolismo crônico.
Com o aumento da concentração da
droga na corrente sanguínea, a função do cerebelo começa a mostrar sinais de
deterioração, provocando desequilíbrio, alteração da capacidade cognitiva,
dificuldade crescente para a articulação da palavra, falta de coordenação
motora, movimentos vagarosos ou irregulares dos olhos, visão dupla, rubor
facial e taquicardia. O pensamento fica desconexo e a percepção da realidade se
desorganiza.
Quando a ingestão de álcool não é
interrompida surgem: letargia, diminuição da frequência das batidas do coração,
queda da pressão arterial, depressão respiratória e vômitos, que podem ser
eventualmente aspirados e chegar aos pulmões provocando pneumonia entre outros
efeitos colaterais perigosos.
Em não-alcoólicos, quando a
concentração de álcool no sangue chega à faixa de 300mg/dl a 400 mg/dL ocorre
estupor e coma. Acima de 500 mg/dL, depressão respiratória, hipotensão e morte.
Metabolismo do álcool
O metabolismo no fígado remove de
90% a 98% da droga circulante. O resto é eliminado pelos rins, pulmões e pele.
Um adulto de 70kg consegue
metabolizar de 5 a 10 gramas de álcool por hora. Como um drinque contém,
em média, de 12 a 15 gramas, a droga acumula-se progressivamente no
organismo, mesmo em quem bebe apenas um drinque por hora.
O álcool que cai na circulação
sofre um processo químico chamado oxidação que o decompõe em gás carbônico
(CO2) e água. Como nesse processo ocorre liberação de energia, os
médicos recomendam evitar bebidas alcoólicas aos que desejam emagrecer,
uma vez que cada grama de álcool ingerido produz 7,1 kcal, valor expressivo
diante das 8kcal por grama de gordura e das 4kcal por grama de açúcar ou proteína.
diante das 8kcal por grama de gordura e das 4kcal por grama de açúcar ou proteína.
Usuários crônicos de álcool
costumam nele obter 50% das calorias necessárias para o metabolismo. Por
isso, frequentemente desenvolvem deficiências nutricionais de proteína
e vitaminas do complexo B.
Tolerância e alcoolismo
crônico
A resistência aos efeitos
colaterais do álcool está diretamente associada ao desenvolvimento da
tolerância e ao alcoolismo.
Horas depois da ingestão
exagerada de álcool, embora a concentração da droga circulante ainda esteja
muito alta, a bebedeira pode passar. Esse fenômeno é conhecido como tolerância
aguda.
O tipo agudo é diferente da
tolerância crônica do bebedor contumaz, que lhe permite manter aparência de
sobriedade mesmo depois de ingerir quantidades elevadas da droga. Doses de
álcool entre 400mg/dl e 500 mg/dl, que muitas vezes levam o bebedor ocasional
ao coma ou à morte, podem ser suportadas com sintomas mínimos pelos usuários
crônicos.
Diversos estudos demonstraram que
as pessoas capazes de resistir ao efeito embriagante do álcool,
estatisticamente, apresentam maior tendência a tornarem-se dependentes.
Síndrome do blackout e da
abstinência
Pode ocorrer em bebedores esporádicos
ou crônicos e caracteriza-se por amnésia que pode durar horas, sem perda de
consciência da realidade durante a crise. O blackout (ou apagamento) acontece
porque o álcool interfere nos circuitos cerebrais encarregados de arquivar
acontecimentos recentes. O quadro, de certa forma, lembra o perfil de memória
das pessoas idosas, capazes de contar com detalhes histórias antigas, mas que
não conseguem recordar o cardápio do almoço.
O álcool é uma droga depressora
do Sistema Nervoso Central. Para contrabalançar esse efeito, o usuário crônico
aumenta a atividade de certos circuitos de neurônios que se opõem à ação
depressiva. Quando a droga é suspensa abruptamente, depois de longo período de
uso, esses circuitos estimulatórios não encontram mais a ação depressora para
equilibrá-los e surge, então, a síndrome de hiperexcitabilidade característica
da abstinência.
Seus sintomas mais frequentes
são: tremores, distúrbios de percepção, convulsões e delirium tremens.
Reconhecimento da dependência
e reabilitação
Uma das características mais
importantes do alcoolismo é a negação de sua existência por parte do usuário.
Raros são aqueles que reconhecem o uso abusivo de bebidas, passo considerado
essencial para livrarem-se da dependência.
As recomendações atuais para
tratamento do alcoolismo, envolvem duas etapas:
a) Desintoxicação –
Geralmente realizada por alguns dias sob supervisão médica, permite combater os
efeitos agudos da retirada do álcool. Dados os altíssimos índices de recaídas,
no entanto, o alcoolismo não é doença a ser tratada exclusivamente no âmbito da
medicina convencional.
b) Reabilitação –
Alcoólicos anônimos – Depois de controlados os sintomas agudos da crise de
abstinência, os pacientes devem ser encaminhados para programas de
reabilitação, cujo objetivo é ajudá-los a viver sem álcool na circulação
sanguínea.
Para que o tratamento tenha
sucesso é fundamental a participação dos familiares e amigos próximos, como
declararam, nas entrevistas gravadas para o Canal Universitário, o jornalista
Ricardo Vespucci e o médico Emanuel Vespucci, autores dos livros “O revólver
que sempre dispara” e “O livro das respostas: Alcoolismo” cuja leitura
recomendamos a todos os interessados no tema. Dessas entrevistas participaram
também um representante dos Alcoólicos Anônimos e duas mulheres da Al-Anon,
associação dedicada a dar apoio e orientação aos familiares dos dependentes do
álcool. Esses depoimentos foram fundamentais para entender a doença do
alcoolismo e suas consequências.
Draúzio Varella